Emília Virginia Lima Curvelo Fontes 1, José Alano Costa de Oliveira Júnior 2, Renato Marrach de Pasqual 3, Renato Sartori de Carvalho 4
DOI: 10.5935/2965-1980.2022v1n2a8
Resumo
A doença de Behçet é uma doença sistêmica, sem marcador específico, cuja descrição clássica é de uma tríade clínica de úlceras genitais, aftas orais e lesão ocular (uveíte). O envolvimento do sistema nervoso (neuro-Behçet) é relatado em 4% a 49% dos indivíduos acometidos pela doença. Relatamos um caso de envolvimento do sistema nervoso, em paciente do sexo feminino com quadro de déficit focal agudo.Dados do caso
Feminino 32 anos
Palavras chaves
Acidente Vascular Cerebral, Doenças de Pequenos Vasos Cerebrais
Histórico Clínico
Paciente K. R. P., feminina, 32 anos. De antecedentes pessoais apresenta: obesidade grau III, tratamento para enxaqueca sem aura e úlceras genitais de repetição tratadas como herpes. Refere que despertou com quadro súbito de cefaleia em hemiface esquerda, pulsátil, de forte intensidade, que prejudicava suas atividades cotidianas, associada a náuseas com vômitos e prostração, sendo medicada em casa com analgésicos comuns. Evoluiu sem melhora do quadro clínico, apresentando hemiparesia em dimídio direito, com dificuldade para deambular, segurar objetos e lentificação da fala.
Achados Radiológicos
Estudo tomográfico e angiográfico do crânio, na chegada ao pronto socorro, não evidenciou alterações relevantes para o quadro. Sorologias para hepatite B, hepatite C, vírus da imunodeficiência adquirida (HIV) e sífilis negativas. Líquor com citometria e bioquímica normal sem bandas oligoclonais. Durante a internação, foi constatada úlcera em região inguinal esquerda com cerca de 1 cm, fundo limpo e dolorosa. A partir disso, foi levantada seguinte hipótese diagnóstica: Sindrômica – síndrome piramidal deficitária/liberação; topográfica – pedúnculo cerebelar E/Ponte; Nosológico – Inflamatório/Imunomediado; Etiológico – Neuro-Behçet. Estudo por Ressonância Magnética do Crânio com injeção de contraste paramagnético identificou lesão heterogênea na ponte com hipossinal na sequência T1 e hiperssinal em T2 e FLAIR , leve efeito expansivo, focos de restrição na sequência de difusão e área ovalada com leve realce periférico paramediana à esquerda.
Discussão
A partir dos achados clínicos e por imagem, a paciente foi submetida à pulsoterapia com corticoide por 5 dias, evoluiu durante a internação com melhora expressiva do quadro clínico, principalmente do déficit motor, evidenciando a natureza imunomediada do quadro de base. Recebeu alta com proposta terapêutica domiciliar com prednisona e azatioprina. Retornou 6 meses após para realizar Ressonância Magnética de Crânio de controle, que observou apenas tênues focos de hipersinal nas sequências T2 e FLAIR esparsos pelo mesencéfalo e ponte, demonstrando melhora radiológica com tratamento à base de imunossupressores e corticoides. A Neuro-Behçet corresponde ao envolvimento neurológico da Doença de Behçet (4-49% dos pacientes) com uma vasculite venosa, que em 97% dos casos o aparecimento de lesões ulcerativas precedem o acometimento do Sistema Nervoso Central (SNC). Há três formas de apresentação clínica da doença no SNC, segundo Al-Fahad e Al-Araj: 1) forma parenquimatosa (síndrome do tronco encefálico, forma stroke like, psiquiátrica, mielopática e forma difusa); 2) hipertensão intracraniana com papiledema; 3) meningite símile. Na série de 50 casos de Kidd et al. 9, além dessas manifestações, houve também comprometimento de nervos cranianos (II, V, VII e VIII).
Lista de Diferenciais
Diagnóstico
Aprendizado
No contexto de déficit focal agudo é de extrema importância a associação da história clínica com os achados de imagem, na tentativa de se estabelecer o diagnóstico correto e início da terapêutica específica.
Referências
Imagens
Tomografia Computadorizada de Crânio sem contraste: sem anormalidades.
Ressonância Magnética com contraste (Pré-tratamento): Lesão heterogênea na ponte com hipossinal na sequência T1 e hiperssinal em T2 e FLAIR , leve efeito expansivo, focos de restrição na sequência de difusão e área ovalada com leve realce periférico paramediana à esquerda.
Ressonância Magnética de Crânio com contraste (6 meses pós-tratamento): tênues focos de hipersinal nas sequências T2 e FLAIR esparsos pelo mesencéfalo e ponte.
Vídeos
Artigo recebido em sexta-feira, 7 de fevereiro de 2020
Artigo aprovado em segunda-feira, 30 de março de 2020