Leticia Tomaz Oliveira 1, Cahinã Odilon Gobbo Da Silva 2, Ângela Maria Borri Wolosker 3, Maria Lúcia Borri 4
Resumo
Caracterizada como uma forma rara de disrafismo espinhal oculto, a diastematomielia é um defeito do tubo neural marcado pela presença de duas hemimedulas assimétricas ou simétricas, cada uma contendo seu próprio canal central. O objetivo deste relato é apresentar um caso de diastematomielia em paciente com sintomas desenvolvidos na idade adulta, destacando-se os principais aspectos de imagem relacionados a essa patologia e seus achados associados.Dados do caso
Feminino, 31 anos.
Palavras chaves
Defeitos do Tubo Neural, Disrafismo Espinal, Anormalidades Congênitas.
Histórico Clínico
Paciente do sexo feminino, 31 anos, com queixa de dor em região lombar que irradiava para face lateral dos membros inferiores associada à parestesia local há um ano. Ao exame físico, notou-se piora da dor em flexão-extensão da coluna e ausência de déficits motores. A paciente foi submetida ao exame de ressonância magnética (RM) da coluna lombar que demonstrou a presença de septo osteocartilaginoso ao nível de L2 com divisão da medula em duas porções, que se encontravam individualizadas em sacos durais distintos, achados característicos da diastematomielia do tipo 1. Além disso, foram identificadas malformações vertebrais e hidrosiringomielia extensa.
Achados Radiológicos
Ao exame de RM da coluna lombar observou-se a presença de septo osteocartilaginoso ao nível de L2 [Figuras 1A e 1B] com divisão da medula em duas porções. Cada hemimedula se apresentava com saco dural individualizado ao nível de L1 a L4, achados característicos da diastematomielia do tipo 1. Foram identificadas ainda, implantação anormalmente baixa do cone medular ao nível de L5-S1 [Figura 2], malformações vertebrais incluindo defeito de fusão dos arcos neurais posteriores desde níveis sacrais até L2 [Figura 3], "vértebras em borboleta" ao nível de L3 e L4 e escoliose toracolombar [Figura 4] e a presença de hidrosiringomielia extensa [Figura 5].
Discussão
A diastematomielia é uma anomalia congênita com provável origem na ausência de fusão na linha mediana de duas notocordas paramedianas no momento da gastrulação, formando assim duas medulas espinhais, cada uma com seu canal medular próprio. Pode ser classificada em tipos I e II, sendo o tipo I (cerca de 25% dos casos) marcado pela presença de um septo osteocartilaginoso com formação de dois sacos durais envolvendo cada uma das hemimedulas, enquanto o tipo II apresenta saco dural único [1,2]. O sexo feminino é o mais acometido por esta condição e a região lombar a mais envolvida. Os sintomas clínicos abrangem principalmente a dorsalgia, parestesia e redução da força muscular nos membros inferiores, os quais tendem a aparecer até a juventude, com a grande maioria dos casos diagnosticados até a idade adulta [3]. A síndrome da medula ancorada pode estar associada à piora neurológica progressiva nesses pacientes [4]. É frequente a associação da diastematomielia com anomalias vertebrais, como espinha bífida posterior, hemivértebras, fusão parcial, dentre outras. A escoliose congênita é encontrada em mais da metade dos pacientes [2]. Outro achado descrito é a presença de hidrosiringomielia, além da possibilidade de outros disrafismos espinhais associados. No caso apresentado, a paciente se enquadra nos aspectos epidemiológicos e de imagem encontrados na diastematomielia do tipo I, destacando-se além dos achados desta patologia, a presença das anomalias vertebrais, a hidrosiringomielia e os sintomas clínicos relacionados à síndrome da medula ancorada.
Lista de Diferenciais
Diagnóstico
Aprendizado
Apesar de ser uma forma rara de disrafismo espinhal oculto, a diastematomielia deve ser lembrada no diagnóstico diferencial de pacientes com deterioração neurológica progressiva, mesmo na idade adulta. O padrão radiológico encontrado nestes casos é característico, auxiliando na propedêutica desta importante condição.
Referências
1 - Trapp B, Freddi TAL, Hans MOM et al. A Practical Approach to Diagnosis of Spinal Dysraphism. Radiographics 2021; 41(2):559-575.
2 - Lacerda SP, Nunes DM, Castro FLO. Anomalias congênitas dia coluna vertebral e da medula espinhal. In: SILVA CIS, D’IPPOLITO G, ROCHA AJ, editores. Coluna Vertebral. Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. p 138-142.
3 - Ahmed AK, Howell EP, Harward S, Sankey, EW, Ehresman J, Schilling A, Goodwin CR. Split Cord Malformation in Adults: Literature Review and Classification. Clinical Neurology and Neurosurgery 2020; 193:105733.
4 - Kulkarni M, Ruparel M, Redkar R. Fetal diastematomyelia: MR imaging: A case report. Indian J Radiol Imaging 2009; 19(1): 78–80.
Imagens
Figuras 1A e 1B: RM da coluna lombossacra nas sequências sagital T2 e axial T2. Nota-se septo osteocartilaginoso (setas amarelas) dividindo as duas porções medulares que se encontram em sacos durais separados. Tais achados são característicos da diastematomielia tipo I.
Figura 2: RM da coluna lombossacra na sequência sagital T2 com saturação de gordura. Observa-se cone medular com implantação anormalmente baixa ao nível de L5-S1 (seta amarela).
Figura 3: RM da coluna lombossacra na sequência axial T2. Ausência de fusão dos arcos neurais posteriores (seta amarela) desde níveis sacrais até L2.
Figura 4: RM da coluna lombossacra na sequência coronal T2 com saturação de gordura. Observa-se deformidade dos corpos vertebrais lombares, com estreitamento do diâmetro anteroposterior, identificando-se aspecto de "vértebra em borboleta" em L3 e L4 (setas amarelas). Nota-se ainda, escoliose na transição toracolombar.
Figura 5: RM da coluna lombossacra na sequência axial T2. Evidencia-se porção medular única, acima de L1, com cavidade hidrosiringomiélica (seta amarela).
Artigo recebido em domingo, 11 de julho de 2021
Artigo aprovado em domingo, 12 de dezembro de 2021