• ISSN (On-line) 2965-1980

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Uroradiologia e Imagem Genital Masculina

ORQUIEPIDIDIMITE TUBERCULOSA.

Alexander Mounteer Colodette 1, Guilherme Castilho Sorensen de Lima 2, Lucas Kenzo Miyahara 3

Resumo

Apresentamos um caso de orquiepididimite bilateral por tuberculose em paciente jovem, com achados demonstrados à ultrassonografia. O paciente apresentava ainda acometimento prostático, pulmonar e do trato gastrointestinal pela tuberculose.

Dados do caso

Masculino, 22 anos.

Palavras chaves

Tuberculose, Tuberculose dos Genitais Masculinos, Orquite, Epididimite.

Histórico Clínico

Paciente jovem, de 22 anos, natural da Bolívia se apresenta no pronto socorro com queixa de edema e rubor escrotal progressivo há 3 meses, com piora há 1 semana. Refere saída de secreção purulenta pela uretra, porém negava febre ou outras queixas urinárias. Nega associação do quadro com relações sexuais. Relata ainda dor ventilatório-dependente e dispneia aos grandes esforços. Realizada ultrassonografia (US) da bolsa testicular com achados sugestivos de processo inflamatório/infeccioso envolvendo os testículos e o epidídimo. O paciente foi tratado inicialmente com antibioticoterapia, porém sem melhora. Devido à persistência do quadro e pela presença de sintomas pulmonares foi realizada avaliação adicional laboratorial, com resultado positivo para a detecção de Mycobacterium tuberculosis no escarro (GeneXpert MTB/RIF). Exames adicionais de imagem demonstraram sinais de acometimento pulmonar, prostático e do trato gastrointestinal Foi realizada a internação hospitalar do paciente para tratamento da tuberculose sistêmica.

Achados Radiológicos

Na investigação inicial foi realizada uma ultrassonografia (US) que evidenciou testículos e epidídimos de dimensões aumentadas, ecotextura heterogênea e fluxo aumentado ao estudo doppler, com algumas áreas mal definidas sem fluxo ao estudo Doppler sugestivas de abscessos testiculares. Observou-se ainda hidrocele bilateral com debris em suspensão (figuras 1 – 3). A tomografia computadorizada (TC) de tórax, abdome e pelve demonstrou, respectivamente, sinais de processo inflamatório/infeccioso pulmonar sugestivo de tuberculose (figura 4) e espessamento ileocecal associado a linfonodos mesentéricos proeminentes, alguns com centro necrótico, achados habituais no acometimento do trato gastrointestinal pela tuberculose (figuras 5). Foi realizada complementação com ressonância magnética (RM) de pelve que demonstrou acometimento difuso das vesículas seminais, ductos deferentes e próstata, que apresentavam intenso baixo sinal heterogêneo em T2 (figura 6), notando-se ainda áreas sugestivas de necrose do parênquima prostático na sequência T1 pós contraste (não mostrado).

Discussão

A tuberculose do sistema geniturinário, apesar de rara, corresponde à segunda forma mais comum de acometimento extrapulmonar da doença. Entretanto o acometimento testicular é responsável por apenas 3% dos casos de tuberculose geniturinária [1]. As principais formas de disseminação são as vias retrógrada, através da próstata e vesículas seminais ou por via hematogênica. Desta forma, o epidídimo usualmente é primeiramente acometido, através de sua cauda, já que é o primeiro local envolvido no mecanismo de refluxo e o local com maior vascularização [1, 2]. Esta condição tem amplo espectro de manifestação, sendo descrito desde um crescimento indolor e progressivo do testículo até formas mais agudas com edema, calor e dor importantes. A formação de tratos fistulosos com a pele é descrita na orquiepididimite tuberculosa, sendo incomum no orquiepididimite bacteriana usual [3]. No entanto, esta doença costuma ser um desafio diagnóstico, sendo os principais diagnósticos diferenciais a orquiepididimite piogênica usual ou processo neoplásico. O acometimento do epidídimo junto ao testículo favorece a hipótese de infecção em detrimento da etiologia neoplásica. [4] A ultrassonografia é o principal método para a avaliação da bolsa testicular e diversos padrões de apresentação são descritos, destacando-se: aumento difuso heterogêneo hipoecoico do testículo; aumento difuso homogêneo hipoecoico do testículo; aumento heterogêneo hipoecoico com lesões nodulares do testículo. Alguns autores advogam que o aumento heterogêneo do epidídimo é confiável na diferenciação da epididimite tuberculosa da não tuberculosa. [5] Devido à sua baixa prevalência e à difícil diferenciação de uma orquiepididimite bacteriana usual os casos muitas vezes são tratados com antibióticos habituais. A ausência de resposta com antibioticoterapia, o acometimento bilateral, e a associação com sinais e sintomas sugestivos de acometimento por tuberculose em outros sítios ajudam no diagnóstico final. No caso do acometimento prostático pela tuberculose, os achados podem ser semelhantes ao do câncer de próstata. Baixo sinal em T2 e restrição à difusão são achados das duas patologias. Uma forma de diferenciar seria a realização de espectroscopia da próstata onde a o câncer demostra níveis reduzidos de citrato, enquanto a tuberculose tem níveis normais [6].

Lista de Diferenciais

  • ORQUIEPIDIDIMITE BACTERIANA
  • TUMORES PRIMÁRIOS DO TESTÍCULO
  • LINFOMA
  • HEMATOMA TESTICULAR
  • SARCOIDOSE
  • METÁSTASES TESTICULARES
  • INFARTO TESTICULAR

Diagnóstico

  • ORQUIEPIDIDIMITE TUBERCULOSA.
  • TUBERCULOSE MULTISISTÊMICA

Aprendizado

Aprendi com o caso que a diferenciação entre orquiepididimite tuberculosa e orquiepididimite bacteriana usual é difícil baseada apenas em parâmetros de imagem e que um dos achados que pode nos guiar nesse caminho é o aumento heterogêneo do epidídimo, além, claro, da história e da avaliação completa do paciente. Aprendi também que a tuberculose prostática pode ser indistinguível do câncer de próstata e a espectroscopia tem papel importante nesta diferenciação.

Referências

Viveiros, Filipa, et al. "Tuberculose testicular: Caso clínico." Revista Portuguesa de Pneumologia (English Edition) 15.6 (2009): 1193-1197.
Michaelides, M., et al. "Tuberculous orchitis US and MRI findings. Correlation with histopathological findings." Hippokratia 14.4 (2010): 297.
WISE, Gilbert J.; SHTEYNSHLYUGER, Alex. An update on lower urinary tract tuberculosis. Current urology reports, v. 9, n. 4, p. 305-313, 2008.
Tessler, Franklin N., Mitchell E. Tublin, and Matthew D. Rifkin. "US case of the day. Tuberculous epididymoorchitis." Radiographics 18.1 (1998): 251-253.
Drudi, F. M., et al. "Tubercular epididymitis and orchitis: US patterns." European radiology 7.7 (1997): 1076-1078.
Cheng, Yue, et al. "Multiparametric magnetic resonance imaging characteristics of prostate tuberculosis." Korean Journal of Radiology 16.4 (2015): 846-852..

Imagens


Ultrassonografia modo B do testículo mostrando testículo direito de dimensões aumentadas, ecotextura heterogênea e hidrocele associada.


Ultrassonografia modo B, mostrando epidídimo direito de dimensões aumentadas, ecotextura heterogênea e fluxo aumentado ao Doppler.


Ultrassonografia Doppler evidenciando testículo direito de dimensões aumentadas, ecotextura heterogênea fluxo aumentado ao estudo Doppler.


Corte coronal de tomografia computadorizada do tórax evidenciando múltiplos micronódulos centrolobulares com padrão em “árvore em brotamento”, por vezes confluentes delimitando consolidações, notadamente nos lobos superiores e segmento superior do lobo inferior direito.


Corte coronal de TC do abdome e pelve com contraste EV demonstra espessamento parietal do íleo terminal associado à alguns linfonodos proeminentes adjacentes, alguns com áreas hipodensas centrais sugerindo necrose/liquefação.


Corte axial de ressonância magnética da pelve ponderado em T2 evidenciando intenso baixo sinal na próstata.

Artigo recebido em sexta-feira, 8 de janeiro de 2021

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