João Antonio Pessôa Corrêa 1, Maria Lucia Borri 2
Abstracto
Doenças priônicas são um grupo heterogêneo de doenças neurodegenerativas raras, sendo a Doença de Creutzfeldt-Jakob a mais comum delas, notadamente sua forma esporádica. Esta ocorre por acúmulo da proteína insolúvel PrPsc (proteínas priônicas alteradas). É um importante diagnóstico diferencial de demência rapidamente progressiva, e a ressonância magnética apresenta padrões típicos que auxiliam na suspeita, uma vez que o diagnóstico definitivo só é possível por meio do estudo histopatológico.Dados do caso
Masculino, 53 anos.
Palavras chaves
Doenças Priônicas, Síndrome de Creutzfeldt-Jakob, Imagem por Ressonância Magnética.
Histórico Clínico
Paciente do sexo masculino, 53 anos, apresentando diplopia, tontura, fraqueza nos membros inferiores e perda ponderal de início há dois meses, com surgimento de fasciculações e alucinações visuais e persecutórias há um mês e desequilíbrio acentuado levando a incapacidade de deambular, tremor, disfagia e incontinência urinária e fecal anterior à internação. Ao exame físico, apresentava força grau II nos membros inferiores e III nos superiores, disdiadococinesia, dismetria e fasciculação lingual. Durante a investigação, foram realizados ressonância magnética e análise do líquido cefalorraquidiano, demonstrando achados sugestivos de doença de Creutzfeldt-Jakob relatados a seguir.
Achados Radiológicos
Ressonância magnética demonstra sinal hiperintenso na sequência FLAIR associado a restrição à difusão envolvendo difusamente o córtex, assimétrico e predominando no hemisfério cerebral esquerdo, e núcleos caudados e putâmens. As imagens pesadas em T2 não apresentam alterações evidentes.
Discussão
A doença de Creutzfeldt-Jakob (DCJ) esporádica é uma patologia rara, sendo doença priônica mais comum em humanos. [1,2] É rapidamente progressiva e invariavelmente fatal. [3] Ocorre por conversão esporádica de proteína priônica existente naturalmente (PrPc) em proteína priônica anormal (PrPsc). [2] São achados histopatológicos a microvacuolização degenerativa da substância cinzenta (degeneração espongiforme) com perda neuronal, gliose e acúmulo de PrPsc. [1,2] O Center for Disease Control (CDC) norte-americano preconiza que o diagnóstico definitivo da DCJ esporádica é histopatológico. [3] Sendo assim, é rara a realização de diagnóstico definitivo, por ser invasivo. O diagnóstico provável pode ser feito associando-se achados clínicos a ao menos um teste paraclínico. Os achados clínicos são a demência rapidamente progressiva associada a ao menos dois dos seguintes sintomas: mioclonia, sinais visuais ou cerebelares, sinais piramidais/extrapiramidais e/ou mutismo acinético. São considerados testes paraclínicos, com achados típicos, o eletroencefalograma (complexos periódicos de ponta-onda), análise do líquido cefalorraquidiano (presença de proteína 14-3-3) e ressonância magnética (RM). Diagnósticos alternativos devem ser excluídos. [3] Na RM, os achados típicos descritos são hipersinal na sequência FLAIR e, principalmente, em DWI, de distribuição cortical e nos núcleos da base. A causa da restrição à difusão ainda não é clara, podendo ser atribuída à restrição da difusibilidade da água pela compartimentalização nos vacúolos ou pela deposição de PrPsc. [1] No córtex, a alteração de sinal pode ser focal ou difusa, simétrica ou assimétrica e em geral poupa a região perirrolândica. [1,2] Nos núcleos da base, os achados podem ser simétricos ou assimétricos, acometendo principalmente os núcleos caudados e putâmens, além de apresentar um gradiente antero-posterior. A alteração de sinal nos núcleos da base apresenta aumento em extensão e intensidade de sinal a medida que a doença progride. Atrofia do cerebelo é descrita na DCJ esporádica. [1] Os achados radiológicos típicos podem preceder as manifestações clínicas. [1] O caso em discussão apresenta alterações típicas da DCJ esporádica na RM, podendo ser utilizado como um critério de diagnóstico provável. (Figs. 1-4) Algumas alterações atípicas podem ser encontradas, como hipersinal em T2, FLAIR e DWI na região posterior (pulvinar) e dorsomedial do tálamo (sinais do "pulvinar" e do "taco de hockey"), mais característico na forma variante da DCJ, hipersinal em T1 no globo pálido e hipersinal no DWI do cerebelo. [1]
Lista de Diferenciais
Diagnóstico
Aprendizado
Apesar do diagnóstico definitivo ser histopatológico, a clínica unida a achados paraclínicos, incluindo a ressonância magnética, determinam o diagnóstico provável da doença. É necessário o conhecimento dos padrões de imagem pelo radiologista, a fim de auxiliar no diagnóstico não invasivo da doença de Creutzfeldt-Jakob esporádica.
Referências
1. Fragoso D, Gonçalves Filho A, Pacheco F, Barros B, Aguiar Littig I, Nunes R et al. Imaging of Creutzfeldt-Jakob Disease: Imaging Patterns and Their Differential Diagnosis. RadioGraphics. 2017;37(1):234-257.
2. Koeller K, Shih R. Viral and Prion Infections of the Central Nervous System: Radiologic-Pathologic Correlation:From the Radiologic Pathology Archives. RadioGraphics. 2017;37(1):199-233.
3. Creutzfeldt-Jakob disease, classic (CJD). Centers for Disease Control and Prevention website. Acessado em 29/04/2020. Disponível em: http://www.cdc.gov/prions/cjd/index.html. Atualizado em 9 de outubro de 2018.
Imagens
Fig.1 - Sequência FLAIR, plano axial, demonstrando hipersinal cortical assimétrico, predominando nos giros frontais e occipitais à esquerda.
Fig.2 - Sequência DWI, plano axial, apresentando restrição a difusão nas mesmas regiões corticais com alteração no FLAIR
Fig.3 - Sequência FLAIR, plano axial mais inferior, observando-se hipersinal nos núcleos caudados e putâmens, além do hipersinal cortical observado previamente.
Fig. 4 - Sequência DWI, plano axial mais inferior, demonstrando restrição a difusão nos núcleos caudados e putâmens.
Artículo recibido en miércoles, 29 de abril de 2020
Artículo aceptado el martes, 12 de mayo de 2020