• ISSN (On-line) 2965-1980

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Cardiovascular

SÍNDROME DO LIGAMENTO ARQUEADO MEDIANO ASSOCIADA A ANEURISMA DA ARTÉRIA GASTRODUODENAL

Filipe Alves Souza 1, Marco Túlio Caldeira Jorge Fialho 2, Rogério Augusto Pinto Da Silva 3, Paulo Roberto Savassi Rocha 4

Resumo

A síndrome do ligamento arqueado mediano (síndrome de Dunbar) é uma doença rara causada pela compressão extrínseca do tronco celíaco e das estruturas neurais adjacentes pelo ligamento arqueado mediano. Frequentemente coexiste proeminência da arcada pancreatoduodenal, que pode se associar a aneurismas das artérias viscerais. A ultrassonografia com Doppler, a angiotomografia computadorizada e a angiorressonância magnética constituem importantes métodos não invasivos utilizados para a investigação.

Dados do caso

Feminino, 39 anos.

Palavras chaves

Síndrome do Ligamento Arqueado Mediano, Aneurisma.

Histórico Clínico

Paciente do sexo feminino, 39 anos, com quadro recorrente de dor abdominal inespecífica associada a diarreia. Realizou ultrassonografia abdominal com Doppler dos vasos esplâncnicos e angiotomografia computadorizada do abdome, que confirmaram o diagnóstico de síndrome do ligamento arqueado mediano associada a aneurisma da artéria gastroduodenal. A paciente foi encaminhada para embolização com molas do aneurisma, seguida por secção cirúrgica do ligamento arqueado.

Achados Radiológicos

Ultrassonografia abdominal com Doppler dos vasos esplâncnicos demonstra estenose na porção proximal do tronco celíaco (figura 1), com fluxo turbulento de alta velocidade no segmento imediatamente a jusante, bem como fluxo de padrão tardus-parvus nas artérias esplênica, hepática própria e gastroduodenal (figura 2). Destaca-se ainda ectasia da artéria gastroduodenal, que apresenta, em sua extremidade mesentérica, dilatação aneurismática sacular (figuras 3 e 4). Angiotomografia computadorizada do abdome evidencia estenose na porção proximal do tronco celíaco (aspecto “em gancho”, com retificação do trajeto do tronco celíaco e leve ectasia pós-estenótica), bem como aneurisma da artéria gastroduodenal (figuras 5 e 6).

Discussão

A síndrome do ligamento arqueado mediano é uma condição rara caracterizada por compressão do tronco celíaco e das estruturas neurais adjacentes pelo ligamento arqueado mediano, que comunica as cruras diafragmáticas na altura do hiato aórtico, com trajeto anterior à aorta e superior ao tronco celíaco [1,2]. Embora a compressão da raiz do tronco celíaco pelo ligamento arqueado mediano seja um achado radiológico frequente, especialmente em pacientes magros, na maioria dos casos não há sintomas associados. Entretanto, compressões mais graves se associam a isquemia dos órgãos nutridos pelo tronco celíaco (fígado, baço, estômago), provocando vicariância de artérias gastro e pancreatoduodenais e inversão do fluxo que se dá da artéria mesentérica superior para o território do tronco celíaco. A síndrome pode ser suspeitada na presença de dor epigástrica pós-prandial precoce, em especial se o/a paciente deitar após a refeição. É mais frequente em mulheres de meia idade, sendo diagnosticada em 2 a cada 100.000 pacientes com dor no quadrante superior do abdome [1]. Os sintomas incluem dor epigástrica (notadamente no pós-prandial imediato), náusea, vômitos, diarreia e perda de peso. O ecoDoppler tem alta sensibilidade para o diagnóstico e tem sido proposto como método de escolha para investigação inicial, devendo ser realizado durante a inspiração e a expiração, bem como no ortostatismo. Observa-se fluxo turbulento, com velocidades elevadas (velocidade de pico sistólico > 200 a 250 cm/s) a jusante da estenose, muitas vezes condicionando dilatação deste segmento. Pode ser observado fluxo com padrão parvus-tardus nas artérias hepática e esplênica. Atualmente, a angiotomografia configura um excelente método de imagem para confirmar o diagnóstico. O achado típico é o aspecto “em gancho”, com retificação do trajeto do tronco celíaco e leve ectasia pós-estenótica. O fluxo retrógrado turbulento na circulação esplâncnica pode levar à dilatação aneurismática das artérias viscerais, sobretudo a pancreatoduodenal. Os aneurismas de artérias viscerais têm se tornado cada vez mais frequentes com o avanço e a difusão das técnicas de diagnóstico por imagem. [3,4]. Estima-se que os pseudoaneurismas desses ramos arteriais sejam mais comuns que os aneurismas verdadeiros, geralmente secundários a um quadro de pancreatite [5,6]. As opções terapêuticas incluem tratamento endovascular, laparotomia e videolaparoscopia. A escolha da abordagem leva em conta a persistência dos sintomas, a associação entre a síndrome de Dunbar e aneurismas viscerais e as características do aneurisma [7].

Lista de Diferenciais

  • Variante anatômica normal do tronco celíaco.
  • Aterosclerose do tronco celíaco.

Diagnóstico

  • Síndrome do ligamento arqueado mediano associada a aneurisma de artéria gastroduodenal.

Aprendizado

A síndrome do ligamento arqueado mediano deve ser lembrada em pacientes submetidos a exame de imagem (frequentemente ultrassonografia abdominal) para investigação de dor abdominal inespecífica, recorrente, notadamente pós-prandial, sem outras alterações no exame que possam justificar o quadro clínico. Nesse contexto, é pertinente também pesquisar aneurismas de artérias viscerais, que podem estar associados à síndrome.

Referências

1. Santos GM, Viarengo LMA, Oliveira MDP. Celiac artery compression: Dunbar syndrome. J Vasc Bras. 2019;18:e20180094.
2. Kim EN, Lamb K, Relles D, Moudgill N, DiMuzio PJ, Eisenberg JA. Median Arcuate Ligament Syndrome-Review of This Rare Disease. JAMA Surg. 2016;151(5):471-477.
3. Chaer RA, Abularrage CJ, Coleman DM, et al. The Society for Vascular Surgery clinical practice guidelines on the management of visceral aneurysms. Journal of Vascular Surgery, Volume 72, Issue 1, Supplement, 2020, Pages 3S-39S.
4. Ducasse E, Roy F, Chevalier J, et al. Aneurysm of the pancreaticoduodenal arteries with a celiac trunk lesion: current management, Journal of Vascular Surgery, Volume 39, Issue 4, 2004, Pages 906-911.
5. Piasek E, Sojka M, Kuczyńska M, et al: Visceral artery aneurysms – classification, diagnosis and treatment. J Ultrason 2018; 18: 148–151.
6. Jesinger RA, Thoreson AA, Lamba R. Abdominal and Pelvic Aneurysms and Pseudoaneurysms: Imaging Review with Clinical, Radiologic, and Treatment Correlation. RadioGraphics May-June 2013, Volume 33, Pages E71-E96.
7. Corey MR, Ergul EA, Cambria RP, et al. The natural history of splanchnic artery aneurysms and outcomes after operative intervention. J Vasc Surg. 2016;63(4):949-957.

Imagens


Figura 1: Imagem ultrassonográfica e com Doppler colorido da raiz do tronco celíaco mostrando acentuada redução de calibre.


Figura 2: Exame com Doppler pulsado da raiz do tronco celíaco exibindo fluxo com velocidade de pico sistólico em torno de 400 cm/s (normal < 200 a 250 cm/s).


Figura 3: Corte sagital do abdômen superior mostrando a artéria mesentérica superior e o aneurisma da artéria gastroduodenal.


Figura 4: Ultrassom com Doppler colorido (Canon Dynamic flow) mostrando o aneurisma sacular próximo à emergência da artéria gastroduodenal na artéria mesentérica superior.


Figura 5: Angiotomografia 2D mostrando estenose do tronco celíaco e aneurisma sacular na extremidade mesentérica da artéria gastroduodenal.


Figura 6: Angiotomografia com reconstrução 3D mostrando aneurisma sacular na extremidade mesentérica da artéria gastroduodenal.

Vídeos


Vídeo 1: Angiografia mostrando o aneurisma sacular na extremidade mesentérica da artéria gastroduodenal.

Artigo recebido em quarta-feira, 21 de outubro de 2020

Artigo aprovado em segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

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