• ISSN (On-line) 2965-1980

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Coronavírus

SÍNDROME DE ENCEFALOPATIA REVERSÍVEL POSTERIOR EM COVID-19 GRAVE

Juliana Cavalcanti de Freitas Reinaux 1, Karenn de Barros Bezerra 2, Vanessa Garcia Santana 3, Sarah Alcântara Cardoso 4

Resumo

Apresentamos o caso de um homem de 46 anos com COVID-19 que desenvolveu insuficiência respiratória aguda com necessidade de intubação prolongada. Foi realizada tomografia computadorizada de cérebro mostrando achados típicos de síndrome da encefalopatia reversível posterior. Esta é uma possível complicação neurológica da COVID-19, que requer controle rígido da pressão arterial nesses pacientes.

Dados do caso

Masculino, 46 anos.

Palavras chaves

Infecções por Coronavirus, Síndrome da Leucoencefalopatia Posterior.

Histórico Clínico

Homem de 46 anos com história clínica pregressa de gamopatia monoclonal e diagnóstico de infecção por SARS-Cov-2 detectada por RT-PCR (do inglês, reverse-transcriptase polymerase chain reaction) 5 dias antes, foi admitido no pronto-socorro apresentando febre, mialgia, dispneia, cefaleia, dor retro-orbital e náuseas. Na admissão, foi realizada gasometria arterial, com valor de pO2 de 76,6 mmHg. Durante a internação, a saturação de oxigênio chegou a 80% em ar ambiente e o valor da pO2 caiu para 54,4 mmHg, sendo adotada oxigenoterapia. Devido à piora do padrão respiratório, foi necessário proceder a intubação orotraqueal e admissão na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) para manutenção em ventilação mecânica. O paciente evoluiu com insuficiência renal aguda com necessidade de hemodiálise e anemia multifatorial sendo submetido a múltiplas transfusões sanguíneas. Em 35 dias após o início dos sintomas foi iniciado o desmame da sedação, porém o paciente apresentou despertar insatisfatório, sendo solicitada Tomografia Computadorizada (TC) de crânio, que evidenciou achados típicos de síndrome da encefalopatia reversível posterior (PRES) com edema parieto-occipital e frontal superior afetando predominantemente a substância branca, além de sinal de hemorragia subaracnóide frontal. O paciente evoluiu sem déficits, sendo solicitada Ressonância Magnética (RM) de crânio 30 dias após o primeiro exame de imagem, que evidenciava regressão significativa dos achados. Em decorrência do desenvolvimento de uma úlcera de decúbito na região lombossacra, o paciente teve alta da instituição para tratamento ambulatorial, porém sem indicação de profilaxia anticoagulante.

Achados Radiológicos

A Tomografia Computadorizada (TC) de crânio inicial mostra material hiperdenso delineando alguns sulcos na alta convexidade do lobo frontal esquerdo (Figura 1.A) compatível com hemorragia subaracnóide. Os cortes mais caudais mostram hipodensidade da substância branca subcortical e profunda acometendo as regiões parieto-occipitais e em menor grau os lobos frontais (Figuras 1 e 2). O conjunto destes achados foi sugestivo de PRES. A Ressonância Magnética (RM) de crânio realizada após 30 dias evidenciava resolução da hemorragia subaracnóide. Era possível identificar áreas de hipersinal T2/FLAIR na substância branca dos lobos occipitais (periventricular, adjacente aos cornos posteriores) e nos lobos parietais, de dimensões significativamente reduzidas em relação ao estudo prévio (figura 3), sem restrição à difusão ou realce pelo meio de contraste (figura 4).

Discussão

A síndrome da encefalopatia reversível posterior (PRES) é uma entidade clínica e radiológica caracterizada pelo aparecimento agudo ou subagudo de cefaleia, alteração do nível de consciência, alterações visuais e convulsões que geralmente se manifestam no contexto de doenças sistêmicas. Aproximadamente 70% -80% dos pacientes apresentam hipertensão arterial moderada a grave [1]. O coronavírus da síndrome respiratória aguda grave 2 (SARS-Cov-2), surgiu como uma doença respiratória em dezembro de 2019 e, semelhante a outros coronavírus, se manifesta principalmente como uma doença respiratória caracterizada por tosse, febre, anosmia e ageusia que pode progredir para síndrome do desconforto respiratório agudo devido ao seu efeito nas vias aéreas inferiores [2]. PRES é uma possível complicação neurológica da doença por coronavírus 2019 (COVID-19), que demanda um controle rígido da pressão arterial em todos os pacientes com Covid-19; já que a encefalopatia hipertensiva, com ou sem PRES, pode ser um fator contribuinte não identificado para os tempos de ventilação prolongados observados em Covid-19 grave. Alguns estudos revelam que os pacientes com Covid-19 que desenvolveram PRES tiveram flutuações de pressão arterial relativamente moderadas, demandando ainda maior controle da pressão arterial, pois pode haver um elemento despercebido de disfunção endotelial que contribui para a encefalopatia hipertensiva com oscilações de pressão arterial relativamente mais suaves na infecção por SARS-CoV-2 [3,4].

Lista de Diferenciais

  • Síndrome da encefalopatia reversível posterior (PRES)
  • Infarto em território da circulação posterior
  • Trombose do seio sagital
  • Encefalopatia hipóxico-isquêmica
  • Hipoglicemia grave

Diagnóstico

  • Síndrome da encefalopatia reversível posterior (PRES) associada a COVID-19

Aprendizado

No contexto de COVID-19 as manifestações neurológicas, sobretudo as doenças cerebrovasculares, têm ganhado importante papel prognóstico. Neste cenário, estar atento aos principais padrões neurorradiológicos de acometimento se faz necessário. A PRES surge como uma complicação bastante factível entre vários diagnósticos diferenciais possíveis para estes casos, onde os achados radiológicos serão definidores em relação à conduta.

Referências

1. Fonseca J, Oliveira K, Cordeiro M, Real MV. Posterior reversible encephalopathy syndrome: A case report. Neurologia. 2019; 34:135-137.
2. Rogg J, Baker A, Tung G. Posterior reversible encephalopathy syndrome (PRES): Another imaging manifestation of COVID-19. Interdiscip Neurosurg. 2020 Dec;22:100808. doi: 10.1016/j.inat.2020.100808. Epub 2020 Jun 22. PMID: 32835015; PMCID: PMC7308006.
3. Kishfy L, Casasola M, Banankhah P, et al. Posterior reversible encephalopathy syndrome (PRES) as a neurological association in severe Covid-19. J Neurol Sci. 2020 Jul 15;414:116943. doi: 10.1016/j.jns.2020.116943. Epub 2020 May 23. PMID: 32474362; PMCID: PMC7245308.
4. Kremer S, Lersy F, de Sèze J, et al. Brain MRI Findings in Severe COVID-19: A Retrospective Observational Study. Radiology. 2020 Nov;297(2):E242-E251. doi: 10.1148/radiol.2020202222. Epub 2020 Jun 16. PMID: 32544034; PMCID: PMC7301613.

Imagens


Figura 1. TC de crânio sem contraste. Imagem A mostra hemorragia subaracnóide envolvendo sulcos da alta convexidade no lobo frontal esquerdo (seta branca). Na imagem B vemos um corte axial mais caudal onde é possível identificar hipodensidade da substância branca subcortical nos lobos parietais (setas pretas) e de forma mais tênue nos lobos frontais.


Imagem 2. TC de crânio sem contraste. As imagens A e B mostram cortes mais inferiores onde se destaca a hipodensidade bilateral da substância branca subcortical e profunda nas regiões parieto-occipitais (setas pretas).


Figura 3. RM de crânio. Sequência FLAIR no plano axial evidencia área de hipersinal da substância branca na região parieto-occipital esquerda (seta vazada), de dimensões reduzidas em relação à área de lesão observada na TC anterior.


Figura 4. RM de crânio. Nas sequências de difusão (DWI) não foram observadas áreas de restrição à difusão das moléculas de água.

Artigo recebido em quarta-feira, 14 de outubro de 2020

Artigo aprovado em segunda-feira, 4 de janeiro de 2021

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