• ISSN (On-line) 2965-1980

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Cardiovascular

ANGIOSSARCOMA DO ÁTRIO DIREITO EM UM PACIENTE DE 18 ANOS DE IDADE

Jesse Marcos de Oliveira 1, Allan Max Silva Cardoso 2, Clarice Santos Parreira Soares 3, Luís Ronan Marquez Ferreira de Souza 4

Resumo

O angiossarcoma do átrio direito é uma neoplasia primária maligna rara, principalmente em pacientes jovens. Os sintomas podem ser de origem sistêmica, cardíaca ou embólica. As diversas modalidades de imagem disponíveis, atreladas a história clínica e epidemiológica, bem como a utilização de abordagens estruturadas que relacionam a localização e as características de imagem das massas cardíacas, podem contribuir sobremaneira no auxílio diagnóstico e propedêutico destes pacientes.

Dados do caso

Masculino, 18 anos.

Palavras chaves

Neoplasias Cardíacas, Sarcoma.

Histórico Clínico

Paciente, 18 anos, sexo masculino, deu entrada na unidade de pronto atendimento da cidade, com náuseas, vômitos, dor torácica, dispneia, tosse, associados a cefaleia de moderada intensidade. Nega perda de peso ou febre nos últimos meses. Exame físico sem alterações relevantes. Estudo laboratorial demonstrando leucocitose e trombocitose discretas. Encaminhado para o HC-UFTM (Hospital de clínicas da Universidade Federal do Triângulo Mineiro) com relato de massa mediastinal, sendo referenciado paro o serviço de radiologia para a realização da propedêutica imaginológica. A análise por imagem multimodal demonstrou poder se tratar de neoplasia maligna primária do coração. Devido a localização no átrio direito e outras características como infiltração tecidual, comprometimento de mais de uma câmara, extensão para o pericárdio com derrame, associado a áreas de hemorragia e necrose, pensou-se na possibilidade de angiossarcoma do átrio direito. Realizada a biópsia através de toracotomia com posterior confirmação da hipótese. O paciente está em avaliação cirúrgica e oncológica para o estabelecimento de terapêutica adequada.

Achados Radiológicos

Realizou-se na sala de emergência uma radiografia de tórax anteroposterior (AP) (Figura 1) que demonstrou alargamento da área cardíaca, às custas do aumento volumétrico do lado direito, associado a opacidades nodulares difusas pelos campos pleuropulmonares bilateralmente. A ecocardiografia (Figura 2) visibilizou massa heterogênea volumosa, de bordas indefinidas, infiltrando o átrio direito com perda da delimitação da parede atrial. A parede livre do ventrículo direito encontrava-se espessada, com aderência também à referida massa, sugerindo infiltração por contiguidade. O estudo hemodinâmico demonstrou fluxo de enchimento do ventrículo direito com padrão restritivo. Na tomografia computadorizada (TC) (Figura 3) evidenciou-se lesão hipodensa volumosa, com realce heterogêneo pelo meio de contraste, centrada na parede livre do átrio direito, associado a componente infiltrativo na parede do ventrículo direito e extensão para pericárdio subjacente. Há discreto derrame pericárdico. Notam-se, também, inúmeros nódulos pulmonares menores que 1,5 cm associados a opacidades em vidro fosco, com distribuição periférica em ambos os pulmões, representando lesões secundárias. Lesão predominantemente com hipossinal associado a focos de hipersinal em T1 (provavelmente relacionados a hemorragia subaguda), com heterogeneidade marcada em T2, bem como áreas de ausência de realce em T1 pós-contraste (necrose) foram as características encontrados no estudo por ressonância magnética (RM) (Figura 4).

Discussão

Tumores cardíacos primários são raros, com incidência estimada entre 1 a 30 casos para cada 100.000 indivíduos, sendo menos prevalentes do que as metástases em até 132 vezes [1]. Dentre esses, os tipos mais frequentes são os mixomas (primeiro no geral) e os sarcomas (mais comum entre os malignos). O angiossarcoma, por sua vez, é o subtipo de sarcoma mais comum, ocorrendo mais frequentemente em homens (2:1) e quase exclusivamente em adultos, com pico de incidência aos 40 anos de idade [2]. Os angiossarcomas afetam principalmente o átrio direito (o que os distingue dos demais sarcomas que são mais comuns nas câmaras esquerdas), assim como o pericárdio, gerando sintomas cardiopulmonares que incluem dispneia, arritmia, edema periférico, tamponamento pericárdico e morte súbita [3]. São duas as principais formas de apresentação já descritas dos angiossarcomas: a primeira caracterizada pela presença de lesão expansiva, bem delimitada, no interior da cavidade atrial, geralmente emergindo da parede livre do átrio direito; e a segunda com formação de massa infiltrativa, estendendo-se ao longo do pericárdio. Apresentam aspecto heterogêneo pelos métodos de imagem, devido a propensão a sangramentos e necrose. Usualmente apresentam metástases no momento do diagnóstico, principalmente para os pulmões, sendo também encontradas lesões no sistema nervoso central, ossos, pele, dentre outros sistemas [3]. A tomografia computadorizada por emissão de pósitrons (PET-TC) é ferramenta não muito disponível em nosso meio, no entanto, possui especificidade acima de 90% para a separação entre lesões malignas e benignas, bem como alta sensibilidade para o estadiamento radiológico. O tratamento do angiossarcoma envolve cirurgia, quimioterapia e radioterapia. O prognóstico é reservado, uma vez que a maioria dos diagnósticos é realizada em estágio avançado já com metástases a apresentação [4].

Lista de Diferenciais

  • Neoplasia cardíaca secundária (metástase)
  • Linfoma cardíaco primário
  • Rabdomiossarcoma cardíaco

Diagnóstico

  • Angiossarcoma do átrio direito com metástases pulmonares

Aprendizado

Angiossarcoma cardíaco é patologia rara, cujo conhecimento é importante para a elaboração do diagnóstico diferencial das massas cardíacas. As principais características de imagem das neoplasias malignas do coração são: invasão local, crescimento rápido, vasos sanguíneos entremeados, hemorragia, necrose, envolvimento de mais de uma câmara cardíaca e derrame pericárdico. A idade, o contexto clínico, a localização e as características de imagem auxiliam sobremaneira na elaboração do diagnóstico.

Referências

1. Tyebally S, Chen D, Bhattacharyya S, et al. Cardiac tumors. J Am Coll Cardiol CardioOnc 2020; 2(2):293-311.
2. Araoz PA, Eklund HE, Welch TJ, Breen JF. CT and MR imaging of primary cardiac malignancies. Radiographics 1999; 19(6):1421-34.
3. Goradia D, Chew FS. Cardiac Angiosarcoma on CT. Radiology case reports 2006; 1(4):126-7.
4. Patel SD, Peterson A, Bartczak A, et al. Primary cardiac angiosarcoma - a review. Med Sci Monit 2014; 20:103-109.

Imagens


Figura 1. Radiografia AP do tórax demonstrando alargamento da área cardíaca (setas vermelhas) às custas do aumento volumétrico do lado direito, associado a opacidades nodulares difusas pelos campos pleuropulmonares bilateralmente (setas brancas).


Figura 2. Ecocardiografia visibilizando massa heterogênea, de bordas indefinidas, infiltrando o átrio direito, com perda da delimitação da parede atrial. A parede livre do ventrículo direito encontra-se espessada, com aderência à referida massa, sugerindo infiltração por contiguidade.


Figura 3. Tomografia computadorizada de tórax antes (A) e após a injeção endovenosa do meio de contraste (B) evidenciando lesão hipodensa volumosa (setas vermelhas), com realce heterogêneo pelo meio de contraste, centrada na parede livre do átrio direito, associado a componente infiltrativo na parede do ventrículo direito e extensão para pericárdio subjacente. Há discreto derrame pericárdico. Notam-se, também, inúmeros nódulos pulmonares (setas brancas) menores que 1,5 cm associados a opacidades em vidro fosco (não demonstradas), com distribuição periférica em ambos os pulmões, representando lesões secundárias.


Figura 4. Estudo comparativo por TC pós-contraste (A), ressonância magnética ponderada em T2 (B), T1 pré (C) e pós-contraste (D) demonstrando lesão volumosa (setas vermelhas) com hipossinal predominante em T1, associado a focos de hipersinal em T1 (seta branca - provavelmente relacionados a hemorragia subaguda), com heterogeneidade marcada em T2, bem como áreas de ausência de realce em T1 pós-contraste (setas verdes – áreas de necrose).

Vídeos


Tomografia computadorizada de tórax em janela de mediastino após a injeção endovenosa do meio de contraste evidenciando lesão cardíaca volumosa com realce heterogêneo pelo meio de contraste, centrada na parede livre do átrio direito, associado a componente infiltrativo na parede do ventrículo direito e extensão para pericárdio subjacente. Há discreto derrame pericárdico. Notam-se, também, inúmeros nódulos pulmonares com densidade de partes moles menores que 1,5 cm, representando lesões secundárias.


Tomografia computadorizada de tórax em janela de pulmão, após a injeção endovenosa do meio de contraste, evidenciando inúmeros nódulos pulmonares menores que 1,5 cm associados a opacidades em vidro fosco (provável inflamação ou hemorragia alveolar adjacente), com distribuição predominantemente periférica em ambos os pulmões, representando lesões secundárias.


Ressonância magnética do mediastino ponderada em T2, apresentando lesão cardíaca volumosa, heterogênea, centrada na parede livre do átrio direito, associado a componente infiltrativo na parede do ventrículo direito e extensão para pericárdio subjacente. Há discreto derrame pericárdico. Notam-se, também, inúmeros nódulos pulmonares menores que 1,5 cm, com hipersinal em T2, representando lesões secundárias.

Artigo recebido em domingo, 30 de agosto de 2020

Artigo aprovado em segunda-feira, 28 de dezembro de 2020

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