• ISSN (On-line) 2965-1980

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Genital (Female)

ACOMETIMENTO UTERINO POR LINFOMA

ANDRE VAZ 1

Abstract

Mulher em acompanhamento por linfoma difuso de grandes células B apresenta acentuado metabolismo glicolítico envolvendo útero em tomografia por emissão de pósitrons (PET-CT). Mediante o resultado do PET-CT, surgiu a necessidade de descartar outra malignidade ginecológica sincrônica.

Dados do caso

Feminine 71 anos

Palavras chaves

Lymphoma, Neoplasms, Uterus, Diffusion Magnetic Resonance Imaging

Histórico Clínico

Mulher de 71 anos foi encaminhada ao ambulatório da cirurgia geral devido a perda de peso (cerca de 12 kg em 2 meses), inapetência, sudorese noturna e aparecimento de linfonodomegalia inguinal esquerda indolor há alguns meses. Apresenta hipertensão arterial sistêmica em uso de carvedilol, aneurisma de aorta abdominal em acompanhamento, dislipidemia em uso de sinvastatina e ansiedade em uso de escitalopram e bromazepam. Ao exame físico, a paciente encontrava-se hipocorada (++/4) e desidratada (+/4). Palpavam-se linfonodomegalias inguinais, a maior à esquerda, esta com consistência fibroelástica, medindo cerca de 4 cm. A paciente foi encaminhada para biópsia do linfonodo inguinal esquerdo, a qual indicou neoplasia pouco diferenciada com elementos imuno-histoquímicos que sugeriram linfoma difuso de grandes células B. Em seguida, realizou-se biópsia de medula óssea, a qual não evidenciou sinais de malignidade, e tomografia por emissão de pósitrons (PET-CT), a qual caracterizou múltiplas linfonodomegalias (acima e abaixo do diafragma) e esplenomegalia com captação do radiotraçador, bem com acentuado metabolismo glicolítico envolvendo útero com SUV máximo de 17,3 (Figura 1). Mediante o resultado do PET-CT, a equipe médica assistente procurou descartar outra malignidade ginecológica sincrônica e solicitou uma ressonância magnética (RM) do abdome e biópsia de colo uterino.

Achados Radiológicos

A RM caracterizou esplenomegalia, múltiplas linfonodomegalias e útero com dimensões aumentadas e hipersinal miometrial difuso (Figura 2A e B). Nas sequências ponderadas em difusão (DWI), caracterizou-se restrição a difusão tanto nas linfonodomegalias, quanto no útero (Figura 2C). Foi realizada uma amputação do colo uterino para definição da etiologia da alteração uterina. A histopatologia evidenciou neoplasia pouco diferenciada (Figura 3) e o perfil imuno-histoquímico (Figura 4) sugeriu proliferação linfoide de células B com alto índice proliferativo (CD20 +++/3, CD3 positivo em linfócitos de permeio, CD10 negativo, BCL-2 + e Ki-67 70%). Apesar dos achados de imagem não serem específicos, a presença de hipersinal miometrial difuso observado nas sequências ponderadas em T2 com preservação do epitélio cervical e endometrial sugeriram o diagnóstico de infiltração uterina por linfoma. Em função da presença de doença sistêmica, as alterações ginecológicas da paciente foram classificadas como infiltração secundária de acordo com os critérios de Fox e More (vide discussão). Quanto a patologia do colo do útero, a expressão de CD20 e a presença de índice de proliferação do Ki-67 de 70% corroboraram com o diagnóstico de linfoma difuso de grandes células B com alto índice proliferativo.

Discussão

DEFINIÇÃO: O linfoma consiste em uma doença linfoproliferativa com típico acometimento linfonodal e de tecidos linfoides [1]. Apesar de incomum, pode haver proliferação de células linfomatosas em praticamente qualquer órgão de linhagem não-linfoide. Tal condição denomina-se de linfoma extranodal e afeta sobretudo o trato gastrointestinal, seguido da cabeça e pescoço e da pele [1]. A estrutura mais acometida por linfoma no trato genital feminino consiste no anexo, seguido pelo corpo e colo uterino e, menos comumente, vulva e vagina. O principal subtipo de linfoma não-Hodgkin identificado no trato genital feminino consiste no difuso de grandes células B (cerca de 45% dos casos), seguido do de Burkitt (cerca de 19%) [1]. ACOMETIMENTO DO TRATO GENITAL: O envolvimento do trato genital feminino por linfoma corresponde a uma manifestação extranodal, podendo ou não estar associada a doença disseminada [2,3]. Na vigência de doença sistêmica, o acometimento genital é considerado uma infiltração secundária por células linfomatosas e sua frequência é variável na literatura: a incidência de manifestações clínicas de envolvimento uterino (como sangramento) varia entre 0,4 e 5%, porém, nos indivíduos submetidos a necrópsia, observa-se uma incidência entre 40 e 50% [2,4]. MANIFESTAÇÃO CLÍNICA: Os principais sintomas do comprometimento ginecológico por linfoma, quando presentes, incluem sangramento vaginal, desconforto perineal e leucorreia [5]. ACHADOS DE IMAGEM: Apesar dos achados de imagem não serem específicos [4], os seguintes aspectos sugerem o diagnóstico de comprometimento ginecológico por linfoma: (a) Útero apresentando dimensões difusamente aumentadas, contornos lobulados [4], realce variável pelo meio de contraste (captação heterogênea [6] ou hipocaptação [3]) e leve a moderado hipersinal miometrial difuso nas sequências ponderadas em T2, preservando o epitélio cervical e endometrial [5,6]; (b) Lesões anexiais expansivas uni ou bilaterais, sólido-císticas ou sólidas homogêneas [3,4], podendo haver leve realce pelo meio de contraste [7]; ACHADOS HISTOPATOLÓGICOS: Os principais elementos morfológicos do linfoma difuso de grandes células B consistem em (a) células volumosas, (b) núcleos grandes redondos ou ovais, (c) cromatina aberta, (d) nucléolo proeminente e (e) padrão de crescimento difuso obliterando a arquitetura subjacente [8]. A imuno-histoquímica demonstra expressão de CD19 e CD20, podendo ainda haver expressão de CD10 e BCL6 [8]. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL: Linfoma uterino primário: alteração do trato genital na ausência de doença sistêmica [1,3].

Lista de Diferenciais

  • Linfoma uterino primário

Diagnóstico

  • Linfoma difuso de grandes células B com alto índice proliferativo e estágio 4 de Ann Arbor

Aprendizado

O trato ginecológico pode estar comprometido no linfoma de forma primária (sem doença sistêmica) ou secundária (associado a doença sistêmica). O linfoma primário do trato genital feminino é extremamente raro, porém o envolvimento secundário é comum, principalmente em casos avançados. O diagnóstico de comprometimento uterino por linfoma deve ser considerado quando se observa hipersinal miometrial difuso nas sequências ponderadas em T2 com preservação do epitélio cervical e endometrial.

Referências

  • 1. Paes FM, Kalkanis DG, Sideras PA, Serafini AN. FDG PET/CT of extranodal involvement in non-Hodgkin lymphoma and Hodgkin disease. Radiographics 2010; 30(1): 269-291.
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Imagens

Figura 1. PET-CT no plano coronal (A), sagital (B) e axial (C) demonstrando múltiplas linfonodomegalias (*), esplenomegalia (e) com captação do radiotraçador, bem como elevado metabolismo glicolítico envolvendo o útero (pontas de seta).

Figura 2. Imagens ponderadas em T2 no plano sagital (A) e axial (B) e em DWI no plano axial (C) demonstrando útero aumentado (ponta de seta) com hipersinal preservando a linha endometrial e restrição a difusão. Nota-se também pequena quantidade de líquido livre no fundo de saco posterior (a), bem como linfonodomegalia obturatória bilateral e inguinal direita com restrição a difusão.

Figura 3. Histopatologia cervical com Hematoxilina-Eosina demonstrando neoplasia pouco diferenciada (A e B). Transição entre o tecido escamoso ectocervical (e) e a infiltração uterina pela neoplasia (i).

Figura 4. Imuno-histoquímica cervical demonstrando PANB/CD20 +++/3 (A) e Ki-67 70% (B), compatível com linfoma difuso de grandes células B.

Vídeos

Article receive on Wednesday, June 10, 2020

Artigo aprovado em Saturday, August 1, 2020

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