O volvo gástrico é uma condição clínica rara, caracterizada por uma rotação anormal do estômago sobre um de seus eixos, estando associada a graus variáveis de obstrução intestinal. A forma de apresentação aguda é potencialmente fatal, podendo evoluir com necrose gástrica em até 30% dos casos. O diagnóstico com base apenas nos dados clínicos é desafiador, o que faz com que os métodos de imagem tenham papel fundamental no diagnóstico desta condição.
Paciente do sexo feminino, 77 anos de idade, com antecedentes pessoais de hipertensão arterial sistêmica e trombose venosa profunda nos membros inferiores, encontrando-se em uso de anticoagulante oral. Comparece ao pronto socorro com queixa de vômitos enegrecidos e dor epigástrica há 1 dia associados à hipotensão postural. Ao exame físico encontrava-se descorada e com abdome doloroso à palpação do epigástrio. Os exames laboratoriais admissionais evidenciaram hemoglobina de 4,9 g/dL. Submetida à endoscopia digestiva alta que evidenciou alteração do eixo gástrico, com impossibilidade de progressão do aparelho, sem lesões mucosas evidentes. Durante o procedimento foi tentada passagem de sonda nasoenteral, porém sem sucesso. Solicitada tomografia computadorizada do tórax, abdome e pelve onde foi caracterizada volumosa hérnia hiatal associada a volvo gástrico. Optado por tratamento cirúrgico videolaparoscópico, sendo proposta hiatoplastia e fundoplicatura, onde foi confirmado o diagnóstico.
Realizada tomografia computadorizada (TC) de tórax, abdome e pelve com contraste endovenoso, evidenciando volumosa hérnia hiatal contendo a totalidade do estômago, que se apresenta horizontalizado (Fig 1). Destaca-se inversão das curvaturas gástricas com a grande curvatura acima da pequena (Fig 2).
O volvo gástrico é uma entidade rara, definida como uma rotação do estômago sobre um de seus eixos (longo ou curto), sendo sua forma aguda potencialmente letal. As causas etiológicas dividem-se em primárias e secundárias, sendo as últimas mais frequentes e caracterizadas pela associação do volvo gástrico com anormalidades estruturais diafragmáticas, destacando-se a frequente associação com as hérnias paraesofágicas.
Os volvos gástricos podem ser classificados como organoaxial ou mesenteroaxial em relação ao eixo do estômago. O tipo organoaxial envolve o eixo longo do estômago (linha que conecta a junção esôfagogástrica ao piloro), sendo o mais comumente associado às hérnias paraesofágicas, e caracterizando-se pela posição horizontalizada do estômago, com a curvatura maior situando-se em posição superior à curvatura menor. Apresenta-se na maioria dos casos de forma aguda, sendo que 70% dos pacientes manifestam-se com a tríade de Borchardt, que consiste na presença de dor epigástrica, vômitos incoercíveis e falha na passagem de sonda digestiva [1]. Rotações acima de 180 graus manifestam-se com obstrução pilórica completa, e necrose gástrica ocorre em até 30% dos casos de rotações organoaxiais, o que faz com que o rápido diagnóstico desta condição seja imperativo ao radiologista. As rotações mesenteroaxiais, por sua vez, são definidas pela rotação envolvendo o eixo curto do estômago (linha transversal que conecta as curvaturas maior e menor), em que o antro gástrico passa a situar-se acima da junção esôfagogástrica. As rotações mesenteroaxiais são usualmente parciais (<180 graus), não estão frequentemente associadas a defeitos diafragmáticos e manifestam-se com sintomas crônicos.
Os principais métodos de imagem utilizados no diagnóstico do volvo gástrico agudo são a radiografia simples e a tomografia computadorizada. Nos quadros agudos, a radiografia simples evidencia volumosa bolha gástrica associada à nível hidroaéreo, frequentemente em posição torácica, em caso de associação com hérnias hiatais. A tomografia computadorizada é o método diagnóstico de escolha [2], por apresentar alta sensibilidade e propiciar melhor definição anatômica, além de evidenciar sinais de estrangulamento. A forma organoaxial é caracterizada ao estudo tomográfico pelo estômago horizontalizado com a grande curvatura acima da pequena, já na forma mesenteroaxial o estômago assume posição verticalizada com a junção antropilórica acima da junção gastroesofágica, existindo, ainda a forma mista, na qual as características se sobrepõem.
- Volvo gástrico organoaxial
- Volvo gástrico mesenteroaxial
- Hérnia hiatal
- Divertículo epifrênico
- Volvo gástrico organoaxial
O volvo gástrico é uma condição rara e seu aspecto de imagem pode se sobrepor ao das volumosas hérnias hiatais, sendo por vezes um desafio diagnóstico. Assim, é essencial ao radiologista reconhecer seu aspecto de imagem, bem como sinais de complicações isquêmicas.
- Chau B, Dufel S. Gastric volvulus. Emerg Med J. 2007 Jun;24(6):446-7. doi: 10.1136/emj.2006.041947. PMID: 17513555; PMCID: PMC2658296.
- Light D, Links D, Griffin M. The threatened stomach: management of the acute gastric volvulus. Surg Endosc. 2016 May;30(5):1847-52. doi: 10.1007/s00464-015-4425-1. Epub 2015 Aug 15. PMID: 26275540.
- Mazaheri P, Ballard DH, Neal KA, Raptis DA, Shetty AS, Raptis CA, Mellnick VM. CT of Gastric Volvulus: Interobserver Reliability, Radiologists' Accuracy, and Imaging Findings. AJR Am J Roentgenol. 2019 Jan;212(1):103-108. doi: 10.2214/AJR.18.20033. Epub 2018 Nov 7. PMID: 30403524; PMCID: PMC6454878.