Daniara Viegas Rebelo Assis1; Alice Schuch2; Carmen Estivallet3; Gustavo Schröeder4; Mauro Weiss5; Renata dos Santos Fernandes6
DOI: 10.5935/2965-1980.2024v3e20240039
HISTÓRICO CLÍNICO
Paciente feminina, 44 anos, hígida e assintomática. Tomografia Computadorizada (TC) de tórax,em janeiro de 2024, revelou lesão incidental no polo superior do rim direito.
ACHADOS RADIÓLOGICOS
A Ressonância Magnética (RM) de abdome total identificou uma lesão cística extra-renal no retroperitônio direito, medindo 2,7 x 2,2 x 2,0 cm, com alto sinal em T1 - teor proteico elevado (Figura 1) e heterogeneidade em T2 (Figura 2). A lesão apresentava paredes finas, leve realce pelo contraste endovenoso paramagnético e compressão extrínseca sutil na cortical renal (Figura 3). Estas características inespecíficas sugeriram a necessidade de avaliação clínica e epidemiológica para acrescentar critérios diagnósticos. Foram excluídas algumas possibilidades diagnósticas, como cisto cortical renal, pela presença de um plano de clivagem com o parênquima; linfocele, devido ao efeito expansivo; e cisto adrenal, pela ausência de contato com a glândula. Consideraram-se outros diagnósticos diferenciais, como pseudocisto pancreático, tumor neuroendócrino e cistoadenoma mucinoso. Dada a possibilidade de etiologias benignas ou malignas, optou-se pelo tratamento cirúrgico videolaparoscópico (Figuras 4, 5 e 6). A análise anatomopatológica confirmou um cisto broncogênico (Figuras 4 e 5), condição rara no retroperitônio, mais frequentemente encontrada próximo à glândula adrenalesquerda, região pancreática ou cárdia gástrica.
DISCUSSÃO
Os cistos broncogênicos são raros, congênitos e benignos, com uma incidência estimada entre 1 a cada 42.000 e 1 a cada 68.000 na população geral, sem distinção entre os sexos (1). A localização mais comum desses cistos é acima do diafragma, no mediastino, sendo sua presença no retroperitônio uma raridade, representando apenas 0,03% de todos os tumores. Quando ocorrem nesta região, costumam estar subdiafragmáticos à esquerda da linha média, perto da glândula adrenal ou peripancreáticos (2). A origem dos cistos broncogênicos se deve a um descolamento aberrante do tecido traqueobrônquico durante o desenvolvimento embriológico (3). Embora muitos cistos sejam assintomáticos, eles podem gerar sintomas em casos de infecção ou compressão de estruturas adjacentes. O diagnóstico definitivo desses cistos requer excisão cirúrgica completa, seguida de análise anatomopatológica, que revela células ciliadas típicas do epitélio pseudoestratificado colunar, além da presença de cartilagem hialina ou músculo liso (1). Nas imagens de RM, os cistos broncogênicos aparecem bem definidos, com paredes finas e intensidade de sinal variável em T1, frequentemente isointensos em relação ao músculo. Em T2, apresentam-se como lesões hiperintensas, com realce das paredes nas sequências T1 com contraste (3). Os diagnósticos diferenciais para o cisto broncogênico retroperitoneal são amplos, sendo que para o caso podem ser elencados, entre outros, a linfocele, o pseudocisto pancreático, tumores neuroendócrinos, cisto adrenal, cisto renal (4). A linfocele é uma lesão predominantemente encontrada no espaço retroperitoneal, ocorre após linfadenectomias, traumas linfáticos e transplante renal, na imagem de RM seu conteúdo é homogêneo, podendo conter gordura e geralmente estão localizadas adjacentes a um rim transplantado ou no trajeto da rota de dissecção de linfonodo (3). O pseudocisto pancreático surge a partir de inflamação pancreática prévia e se localiza principalmente no pâncreas e região peripancreática, a estratificação ou detritos dependentes são altamente específicos. Os tumores de linhagem neurogênica devem ser sempre lembrados como diagnóstico diferencial de lesões retroperitoneais. Os cistos da glândula adrenal são raros, podem conter conteúdo hemorrágico e calcificação em suas paredes (5). Quando o diagnóstico diferencial é com cisto cortical renal, devemos utilizar a classificação de Bosniak versão 2019 para estratificar o risco de malignidade. Esta lesão seria classificada como Bosniak II, considerado benigno. Ele não apresenta características que sugerem malignidade e, portanto, não requer acompanhamento específico ou intervenção terapêutica (6). A diferenciação entre essas patologias é essencial, pois cada uma requer uma abordagem terapêutica distinta. O diagnóstico definitivo só pode ser confirmado por meio da excisão cirúrgica e subsequente análise anatomopatológica (7). Apesar disso, uma conduta expectante pode ser uma alternativa em lesões que tenham classificação benigna (6).
DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS
- Cisto cortical renal
- Linfocele
- Pseudocisto pancreático
- Tumor neuroendocrino
- Cisto adrenal
- Cistoadenoma mucinoso
O QUE APRENDI COM ESTE CASO
Lesões císticas retroperitoneais possuem diagnósticos diferenciais com potencial evolutivo incerto. A conduta conservadora pode ser considerada, mas a excisão cirúrgica é uma opção segura e resolutiva.
REFERÊNCIAS
1. Gross DJ, Briski LM, Wherley EM, Nguyen DM. Bronchogenic cysts: a narrative review. Mediastinum, 2023; 10.21037/med-22-46.
2. Castro R, Oliveira MI, Fernandes T, Madureira AJ. Retroperitoneal bronchogenic cyst: MRI findings. Case Rep Radiol. 2013;2013:853795. doi: 10.1155/2013/853795. Epub 2013 Dec 4. PMID: 24381777; PMCID: PMC3867953.
3. Hegazi TM., Al‐Sharydah AM., Lee KS., Mortele K. Retroperitoneal cystic masses: magnetic resonance imaging features. Springer, 2019; 10.1007/s00261-019-02246-2.
4. SANTO-FILHO MA, COLLEONi R, SHIGUEOKA DC, ARTIGIANI R, SCALABRINI M, LOPESFILHO G de J. Primary retroperitoneal mucinous cystadenoma - case report. ABCD, arq bras cir dig [Internet]. 2014Jul;27(3):224–6. Available from: https://doi.org/10.1590/S0102-67202014000300016
5). Kim YH, Saini S, Sahani D, Hahn PF, Mueller PR, Auh YH. Imaging diagnosis of cystic pancreatic lesions: pseudocyst versus nonpseudocyst. Radiographics. 2005 May-Jun;25(3):671-85. doi: 10.1148/rg.253045104. PMID: 15888617.
6). Bosniak Classification of Cystic Renal Masses, Version 2019: An Update Proposal and Needs Assessment. Stuart G. Silverman, Ivan Pedrosa, James H. Ellis, Nicole M. Hindman, Nicola Schieda, Andrew D. Smith, Erick M. Remer, Atul B. Shinagare, Nicole E. Curci, Steven S. Raman, Shane A. Wells, Samuel D. Kaffenberger, Zhen J. Wang, Hersh Chandarana, and Matthew S. Davenport. Radiology 2019 292:2, 475-488
7). Alzaraa A., Mousa H., Dickens P., Allen J. and Benhamida A. Idiopathic benign retroperitoneal cyst: a case report. Journal of Medical Case Reports, 2008; 10.1186/1752-1947-2-43.
IMAGENS
Figura 1: RM, corte axial, T1 GRE de oposição de fase (A) “fora de fase” e (B) “em fase” sem identificação de queda de sinal, sugerindo ausência de gordura intralesional.
Figura 2: Imagens ponderadas em T2 de Ressonância Magnética (RM) com aquisição axial (A) tse com saturação da gordura, demonstra formação cística com conteúdo heterogêneo; (B) T2 HASTE evidencia presença de nível líquido- líquido. Presença de fino plano de clivagem entre a lesão e o parênquima renal, determinando leve compressão extrínseca da cortical do terço médio, sem identificação do “sinal da garra”, achados que sugerem o centro geométrico da lesão na gordura perirrenal.
Figura 4 RM, aquisição coronal ponderada em T1 com o uso do meio de contraste paramagnético, demonstra leve realce das paredes da lesão cística.
Figura 5: Análise da microscopia com maior aumento e maior detalhe das células ciliadas típicas do epitélio pseudoestratificado colunar ciliado
Artículo recibido en viernes, 8 de noviembre de 2024
Artículo aceptado el jueves, 30 de enero de 2025