Gabriella Souza e Silva 1, Giuseppe D'Ippolito 2
Resumo
Apresentamos um raro caso de perfuração gástrica espontânea decorrente de um linfoma primário do estômago. Diante de uma perfuração gástrica, a possibilidade de neoplasia subjacente deve ser lembrada. Alguns achados auxiliam da suspeita diagnóstica, tais como a identificação de uma massa parietal e a presença de metástases ou linfonodos comprometidos. Apesar de infreqüente, o linfoma gástrico primário, mesmo sem quimioterapia prévia, pode ser uma causa de perfuraçãoDados do caso
Masculino 62 anos
Palavras chaves
Linfoma, Estômago, Perfuração Espontânea, Tomografia Computadorizada de Emissão
Histórico Clínico
Dor epigástrica com irradiação para dorso e sudorese noturna há 6 meses, com perda de 30 kg neste período. Exames laboratoriais e marcadores tumorais dentro dos limites da normalidade.O paciente procurou o pronto-atendimento e foi submetido a tomografia computadorizada (TC) do abdome com contraste que revelou extensa lesão gástrica. Na endoscopia digestiva alta (EDA), observou-se extenso tumor gástrico ulcerado com fístula, que foi biopsiado. O anatomopatológico e a imuno-histoquímica revelaram linfoma não-Hodgkin difuso de grandes células, imunofenótipo B.
Achados Radiológicos
A TC evidenciou lesão gástrica caracterizada por espessamento parietal do fundo e corpo com área de ulceração que permitia comunicação da luz gástrica com a cavidade peritoneal, onde se observava uma coleção heterogênea, com paredes espessas e irregulares, medindo cerca de 10,0 cm de diâmetro, se estendendo ao baço e à parede abdominal lateral esquerda (figuras 1-3). Notava-se ainda uma lesão paravertebral esquerda na transição toracolombar com centro necrótico e extensão de cerca de 5,0 cm (figura 2), de aspecto semelhante ao comprometimento da parede abdominal lateral esquerda.
Discussão
A perfuração gástrica pode ocorrer em decorrência de uma neoplasia gástrica, particularmente em massas ulceradas de adenocarcinoma, linfoma ou tumor estromal gastrointestinal (GIST)[1]. O adenocarcinoma gástrico deve ser prontamente lembrado, uma vez que 10-16% de todas as perfurações gástricas são por adenocarcinoma (mas apenas 1% dos adenocarcinomas gástricos cursam com perfuração). A frequência de perfuraçãogástrica espontânea (não relacionada à quimioterapia) decorrente de linfoma primário não está bem estabelecida na literatura[2]. O linfoma gástrico primário corresponde a 1- 5% de todos os tumores gástricos, sendo o linfoma difuso de grandes células B o tipo mais comum, seguido pelo linfoma MALT [3]. Considera-se primário do trato gastrointestinal aquele linfoma que ao diagnóstico não apresenta sinais de disseminação da doença, como acometimento linfonodal à distância, ou hepatoesplênico [3]. É interessante observar que entre 24 casos de perfuração gástrica por linfoma, em apenas 6 (25%)a perfuração ocorreu pré-quimioterapia[4]. Sabe-se que perfuração de linfoma gástrico ocorre ocasionalmente em pacientes que recebem quimioterapia (QT), por necrose tumoral, sendo estimada em 0,9% a 1,1% dos casos. Por outro lado, a perfuração espontânea do linfoma gástrico é rara quando comparada à perfuração em pacientes submetidos à QT. A fistulização para órgãos adjacentes, como o baço, observada no caso aqui apresentado, é ainda mais rara [5, 6].
Lista de Diferenciais
Diagnóstico
Aprendizado
Diante de uma perfuração gástrica detectada no exame de imagem, a possibilidade de neoplasia subjacente deve ser lembrada e que alguns achados nos ajudam a sugerir esta condição, como a identificação de uma massa parietal, a presença de metástases ou linfonodos comprometidos. Apesar de infreqüente, o linfoma gástrico primário, mesmo sem QT, pode ser uma causa de perfuração.
Referências
Imagens
Figura 1: Espessamento parietal do fundo e corpo gástrico com ulceração (seta) que comunica a luz gástrica com a cavidade peritoneal, onde há formação de uma coleção (asterisco).
Figura 2: Coleção com paredes espessas e irregulares, com foco gasoso de permeio (asterisco) pela comunicação com a luz gástrica, comprometendo o baço (cabeça de seta) e parede abdominal lateral esquerda (seta longa), sugerindo componente tumoral infiltrativo. Lesão paravertebral esquerda (seta curta), suspeita para acometimento neoplásico secundário.
Figura 3: Em reconstrução coronal, observa-se o espessamento parietal gástrico, a coleção (asterisco) e a extensão ao baço (cabeça de seta). O paciente apresentava ainda derrame pleural à esquerda (seta).
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Artigo recebido em sábado, 25 de janeiro de 2020
Artigo aprovado em sexta-feira, 31 de janeiro de 2020