ASSIS, A. P. M. - Ana Paula Melo de Assis - R3 em Radiologia e Diagnóstico por Imagem do Hospital Leforte 1, CARRETE JUNIOR, Henrique - Henrique Carrete Junior - Chefe do Departamento de Diagnóstico por Imagem da Escola Paulista de Medicina - UNIFESP. 2
DOI: 10.5935/2965-1980.2022v1n2a13
Resumo
A otite média coalescente é decorrente da falha do tratamento de uma otite média aguda que evolui para erosão óssea. A otite média aguda é uma inflamação da orelha média que pode envolver outros espaços pneumatizados do osso temporal por contiguidade. Quando ela ocorre simultaneamente a mastoidite o termo otomastoidite é usado. Suas complicações possuem alta taxa de morbimortalidade e são divididas em intra (meningite, abscessos) ou extracranianas. Há um grau variável de sinais neurológicos.Dados do caso
Masculino 79 anos
Palavras chaves
Otite Média, Abscesso Encefálico, Meningite, Ventriculite Cerebral, Mastoidite
Histórico Clínico
FJG, masculino, 79 anos, em acompanhamento com otorrinolaringologista há 4 meses por perda auditiva à direita. Foi internado por quadro súbito de afasia e cefaleia há 6 horas. Ao exame físico apresentava ptose e desvio de rima à esquerda. Foram realizados exames de imagem para melhor elucidação do caso.
Achados Radiológicos
Na investigação inicial foi realizada ressonância magnética de crânio (RM) tendo sido identificado sinais de otomastoidite aguda à direita (figura 1). Paciente recebeu alta hospitalar sendo prescrito terapia antimicrobiana. Após 44 dias, retornou ao PS com piora do quadro de afasia, cefaleia e perda auditiva à direita além de dificuldade de deambulação, diminuição da acuidade visual e marcha atáxica sendo levantada a hipótese de otomastoidite complicada com meningite. Foi realizada tomografia computadorizada de mastoides (TC) que demonstrou otomastoidite com sinais de erosão de algumas células da mastoide à direita com tênue descontinuidade da cortical temporal posterior (figura 2). Na sequência da investigação foi realizada nova RM que evidenciou conteúdo com características de material purulento na cisterna do ângulo pontocerebelar direito acompanhado de impregnação dural (figura 3). Foi evidenciado também sinais de leptomeningite e ventriculite (figuras 4 e 5 ).
Discussão
A otomastoidite coalescente ocorre quando há erosão óssea e extensão do processo inflamatório ou de produtos da inflamação além das barreiras anatômicas da orelha média e mastoide, permitindo o acometimento de estruturas adjacentes, ou seja, ocorre uma extensão desta infecção para outras regiões do osso temporal (região petrosa) e para o crânio (meninges e parênquima cerebral) por continuidade e, menos freqüentemente, por via hematogênica. A incidência dessas complicações diminuiu significativamente após a expansão do uso dos antimicrobianos (intracranianas de 2,3% para 0,04% e dos abscessos de 20% para menos de 0,5%). Entretanto, as complicações continuam representando uma situação de risco devido ao seu prognostico ruim e à sua elevada taxa de mortalidade, chegando até 36%. O longo período de evolução e a investigação médica inadequada favorecem às complicações decorrentes da disseminação do processo infeccioso para estruturas intra e extracranianas. O médico deve estar atento ao diagnóstico e tratamento precoce da otomastoidite, a fim de evitar a cronificação da infecção e o desenvolvimento de suas complicações. Por vezes, torna-se difícil diagnosticar clinicamente a fase evolutiva da doença ou mesmo em que forma se apresenta, devendo-se solicitar exames de imagem subsidiários. À admissão, o paciente apresentou importantes sinais e sintomas relatados na literatura em relação à otomastoidite coalescente com abscesso retromastoideo, leptomeningite e ventriculite, como afasia, cefaleia, ptose e desvio de rima além da persistência do quadro geral e surgimento de dificuldade de deambulação, estrabismo convergente, diminuição da acuidade visual e marcha atáxica apesar do início de antibioticoterapia empírica. O abcesso retromostaideo ocorre quando a supuração escapa através do fino ou erosado córtex da mastóide e é aprisionado pelo periósteo e pela pele que recobrem o osso temporal e a ponta da mastóide. A cultura do líquido cefalo raquidiano (LCR) apresentou-se compatível com diagnóstico de meningite bacteriana com celularidade de 7680 (linfófictos 3, monócitos 7, neutrófilos 90), proteína 216, glicose 39, ureia 71, cloro 121, lactato 67 e PANDY+. Segundo a literatura, o diagnóstico de meningite associado à otomastoidite impõe a realização de um exame de neuroimagem para avaliação de possível associação com outra complicação intracraniana. A RM é a mais utilizada, principalmente devido à técnica de difusão que permite caracterizar alterações na motilidade das moléculas de água no interstício do parênquima cerebral. A TC fornece informações detalhadas
Lista de Diferenciais
Diagnóstico
Aprendizado
Frente ao diagnóstico de importante otomastoidite aguda no primeiro exame de RM o médico deve estar atento à ocorrência das possíveis complicações decorrentes da falha do tratamento e extensão do processo infectoinflamatório para estruturas contíguas. Apesar da frequência de tais condições ter reduzido com o uso dos antibióticos, elas ainda representam importante morbimortalidade aos pacientes acometidos, principalmente àqueles com extremo de idade.
Referências
Imagens
Figura 1 - Ressonância magnética em corte axial do encéfalo com sequência FLAIR mostrando o conteúdo fluido preenchendo as células da mastoide à direita (seta vermelha) e orelha média (seta verde) .
Figura 2 - Tomografia computadorizada em corte axial mostrando material hipodenso preenchendo as células da mastoide direita (seta vermelha). Erosão de algumas células da mastoide a direita com descontinuidade da cortical junto à fossa posterior (seta verde).
Figura 3 - Ressonância magnética do encéfalo em corte axial FLAIR mostrando conteúdo na cisterna do ângulo pontocerebelar direito (seta verde).
Figura 4 - Ressonância magnética do encéfalo em corte axial na sequência DWI (difusão) mostrando imagens com restrição a difusão em sulco lateral esquerdo (seta vermelha) além de conteúdo com estas mesmas características de sinal no interior das cavidades ventriculares (setas verdes), compatível com quadro de leptomeningite e ventriculite.
Figura 5 - Ressonância magnética do encéfalo em corte axial com sequencia ponderada em T1 pós-gadolínio mostrando impregnação meníngea, notadamente na cisterna do angulo ponto-cerebelar direito (setas vermelhas).
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Artigo recebido em segunda-feira, 23 de março de 2020
Artigo aprovado em segunda-feira, 30 de março de 2020